segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Mostra Artística - Segunda Jornada Internacional de Pesquisa em Arte







































Amanhã, terça-feira, será a abertura da 2a Jornada Internacional de Pesquisa em Arte da Unesp.
O evento dá uma previa de pesquisas em andamento, através da Mostra Artistica e das Mesas de Comunicação. Também haverá palestras de pesquisadores convidados, incluindo a artista Rosana Paulino, desse post aqui.

A programação que você ode conferir no site da Jornada

Vou participar da Mostra Artística com obras que são parte da série Indivisível, produção da minha pesquisa de mestrado. São três fotografias reveladas em goma bicromatada sobre madeira, e em tamanho grande - a área da imagem é de 88 x 150 cm! Falei sobre a goma bicromatada neste post. As imagens foram feitas a partir do mesmo negativo, mas com pigmentos diversos, e tratamentos diferentes. Os resultados são bem diferentes, mostrando algumas possibilidades do múltiplo a partir de uma única matriz.

AVISO: contém nudez! Trabalho com nu artístico desde a graduação, mas sempre considerei as imagens que produzo muito palatáveis, tranquilamente aceitas. Talvez pelo fato de não serem fotografias muito nítidas, e acabam ficando com aspecto de gravura ou desenho. Os processos artesanais costumam diminuir a nitidez da imagem, e acrescentar ruídos, o que diminui o impacto de uma possivel genitália aparecendo. Mas nesses tempos em que tanta coisa no mundo da arte está sendo acusada de agredir "a família, a moral e os bons costumes", é válido avisar.

Vamos?


3 de Setembro - terça-feira
Abertura Oficial do Evento: 14h10
Abertura da Mostra Artística: 17h - Galeria de Arte Alcindo Moreira Filho
A Mostra ocorre entre os dias 3 e 6 de outubro.

Instituto de Artes Unesp
Rua Dr. Bento Teobaldo Ferraz, 271
Barra Funda, São Paulo

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

A Serpente

Hoje gostaria de voltar ao início, e falar sobre a primeira série fotográfica que realizei com processos artesanais, a Serpente. Esse trabalho começou em 2008, com uma pesquisa que eu estava fazendo na faculdade sobre culturas indígenas, e em especial a pintura corporal. Quis fazer uma releitura dessas pinturas no meu próprio corpo, registrando em fotografia. Mas logo percebi que, nesse trabalho, a fotografia não era apenas um registro, mas a própria obra. Por sugestão do professor que estava orientando o projeto, Agnus Valente, comecei a revelar as imagens com a técnica Van Dyck Brown, que eu já mostrei nesse post. Nesse momento não tive resultados satisfatórios, foi só o primeiro contato.

Eu queria representar nas imagens uma espécie de ritual solitário, algo que se aproximasse de uma sessão de yoga, um momento de se conectar consigo mesmo. A propósito, yoga
em sânscrito significa justamente união, reunir. Então, eu fui criando uma mistura que eu nem imaginava, unindo pintura corporal com yoga, e depois a fotografia artesanal. Mal sabia eu que continuaria pesquisando esse processo por quase 10 anos, até o momento!

No ano seguinte (2009), para o Trabalho de Conclusão de Curso, decidir refazer esse trabalho, aprofundando a pesquisa. Pesquisei sobre as pinturas corporais indígenas, sobre o desenho utilizado, que é conhecido por nós como "grega", e sobre o simbolismo da serpente. Percebi que a pintura corporal se relaciona com o símbolo da serpente, apontando para uma transformação, visto que as serpentes mudam de pele. Em outro post vou aprofundar essa relação, e também vou escrever sobre o processo de pintura corporal.

Dessa vez realizamos a pintura no corpo todo. Digo realizamos por que o artista Aldrin Booz já estava me auxiliando nesse processo, ajudando a fazer a pintura, a definir a organização do desenho no espaço, e a captar imagens, since 2008 (Gratidão pela parceria!). 

A parte final dessa obra foi realizar a revelação das fotografias em Van Dyck Brown, dessa vez com algodão cru como suporte. Aliás, foi nesse momento que eu aprendi a revelar usando esta técnica. Hoje é engraçado lembrar o quanto me atrapalhei nessa época, mas foi parte do aprendizado.

Serpente I, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown sobre algodão. 
52 x 44 cm.





















Serpente II, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown sobre algodão. 
52 x 44 cm.






















Até então eu não tinha entendido que é possível trabalhar em um ambiente apenas sombreado; não é necessário usar apenas a luzinha vermelha de laboratório fotográfico. Fiz a aplicação da emulsão no tecido em casa mesmo. Eu havia encapado a lâmpada com camadas de celofane vermelho na tentativa de simular a luz vermelha. Com a luz muito baixa, não enxergava bem o que estava fazendo, e deixei  a emulsão respingar bastante nas margens das fotografias - o que foi um acidente, mas eu gostei e incorporei o resultado. Assim foram as primeiras lições do processo rs

Eu queria fazer muitas imagens ao mesmo tempo, o que hoje eu acho inviável. E não gostava de perder tempo fazendo a tira de teste (teste feito para calcular o tempo ideal de exposição à luz), e por isso acabava deixando muitas imagens superexpostas ou subexpostas. É sério, se você quiser fazer fotografia artesanal, faça o teste, para evitar desperdiçar tempo e material. Algumas das imagens eu revelei usando a luz do sol, e nesse caso é mais difícil precisar o tempo de exposição à luz, pois a intensidade varia durante o dia. Dessa forma o controle sobre o processo é menor.

Serpente III, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown sobre algodão. 
52 x 44 cm.


Serpente VI, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown sobre algodão. 
52 x 44 cm.

Também apareceram algumas manchas, talvez porque o suporte ainda estivesse um pouco úmido quando foi exposto à luz. O Van Dyck Brown pode ser bem temperamental, principalmente quando a pessoa não tem experiência, e acaba sendo desatenta...

Serpente IV, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown
sobre algodão. 
44 x 52 cm.

Serpente V, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown
sobre algodão. 
44 x 52 cm.

Serpente VIII, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown
sobre algodão. 
44 x 52 cm.

























































Serpente VII, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown
sobre algodão. 
44 x 52 cm.



























Mas, mesmo com esses "contratempos", esta foi a primeira série que revelei e tive bons resultados. E principalmente, Serpente abriu esse caminho para minha produção, me deu uma mostra do potencial da fotografia artesanal, e trouxe essa vontade de conhecer, de pesquisar e criar mais.

Serpente IX, Amanda Branco, 2009. Van Dyck Brown sobre algodão. 
52 x 44 cm.

























segunda-feira, 8 de maio de 2017

Fotogramas na oficina de Elizabeth Lee

Exercício de fotograma e cianótipo que realizei na oficina.

























Depois de um intervalo necessário, estou de volta ao Laboratório. Andei sumida porque às vezes a vida acadêmica faz isso com as pessoas. Mas vamos ao tema de hoje: quero mostrar um pouco mais sobre o fotograma, a fotografia sem câmera, que já expliquei nesse post.
Essa é uma das mais antigas técnicas fotográficas. Foi inventada por Talbot, e era chamada de “photogenic drawings” ou “desenhos fotogênicos”. Na época, o objetivo era que fosse uma cópia da realidade, mas mais tarde artistas foram percebendo seu potencial. Man Ray foi pioneiro no uso experimental da técnica, e chamou os fotogramas que ele produzia de rayographs.
[Ao que parece os pesquisadores das técnicas fotográficas gostavam mesmo de batizar as técnicas com seus nomes: Daguerreótipo, Talbótipo, Rayografia… provavelmente uma forma de garantir o prestígio pela técnica.]
Em março deste ano, participei de uma oficina no Sesc Itaquera com Elizabeth Lee, fotógrafa e pesquisadora de processos alternativos de fotografia. A oficina era inspirada no trabalho da botânica Anna Atkins, que usou a técnica do fotograma juntamente com cianótipo para catalogar diversas espécies de plantas. Atkins criou assim, em 1843, o primeiro livro ilustrado com fotografias - um ano antes de Talbot publicar o livro The Pencil of Nature (O Lápis da Natureza), que foi ilustrado com fotografias em calótipo.
Na oficina com a Elizabeth Lee, fizemos fotogramas utilizando folhas secas diversas, e revelando também com a técnica do cianótipo. Algumas das imagens estão no meu Instagram.
Os papéis já estavam previamente sensibilizados com a emulsão do cianótipo. 
Aqui foi feita a composição com folhas e flores secas.


A caixa de luz feita pela própria Elizabeth garantiu que fizéssemos varias
exposições à luz. Naquele dia de garoa não dava para contar com a luz do sol. 
Ou, até dava, mas seriam exposições muito mais longas: algumas horas, em
vez de poucos minutos.



















Minha imagem sendo revelada pela Elizabeth.













































Outras imagens que fiz na oficina .





























Por fim, uma imagem foi feita usando folhas secas e o negativo de um retrato da própria Anna Atkins. Uma homenagem apropriada.



























A oficina foi uma experiência muito boa. Eu já conhecia a técnica do cianótipo, mas foi uma forma de aprimorar os conhecimentos, pois a Beth é especialista! Além de ser enriquecedor conhecer as pessoas da área e ver o que elas estão criando. A Elizabeth tem feito oficinas em diversas unidades do Sesc. Para saber mais sobre o seu trabalho, dê uma olhada nos blogs: 

sexta-feira, 17 de março de 2017

A Goma Bicromatada

A Praia. Amanda Branco, 2012. Goma bicromatada sobre papel.

























Hoje retomo o tema da fotografia artesanal, trazendo uma técnica que uso bastante: a goma bicromatada, ou goma arábica. Esta prática é feita com uma emulsão fotossensível de goma arábica e dicromato de potássio. A mistura é praticamente incolor, e por isso adicionamos um pigmento - geralmente aquarela- a essa emulsão, gerando imagens monocromáticas ou policromáticas
O processo é semelhante a outras técnicas artesanais de fotografia: aplica-se a emulsão no suporte, que depois é seco e, em contato com um negativo, é exposto à luz. Apenas as partes da emulsão que receberam luz endurecem. A revelação então é feita em água, dissolvendo as partes que não receberam luz, e tornando a imagem visível.
Você pode encontrar o passo a passo no livro Fotografia Pensante, de Luiz Monforte, que eu já citei em posts anteriores, e no blog Alternativa Fotográfica.
Apesar dessas semelhanças, a goma tem o diferencial de ser especialmente passível de intervenções, possibilitando maior presença da subjetividade do artista. As manipulações diretas na imagem, juntamente com o trabalho em camadas de cor, aproxima a técnica da pintura e da gravura.
O tempo da revelação varia de acordo com o papel utilizado, com a concentração da emulsão, e também com o resultado que se deseja obter. Durante o processo da revelação, podemos usar uma esponja para limpar as áreas que desejamos deixar mais claras.
Se a proposta é uma fotografia com mais de uma cor, é preciso realizar uma nova sensibilização do papel, e depois uma nova revelação. Em uma imagem em três cores, cada cor é feita com um negativo diferente, e um novo processo de revelação. Vale lembrar que o papel precisa ser resistente para aguentar esses sucessivos banhos. Para obter uma imagem nítida, as impressões devem sair todas na mesma posição, sendo necessário fazer um registro -porém  ignorar o registro também é uma opção, caso se queira uma imagem não "encaixada".


Os três negativos usados para criar esta imagem.


Variações da série A Praia, feitas com os mesmos negativos. 
A da direita em goma bicromatada e as outras duas em
cianótipo e goma bicromatada.

















Minhas primeiras experiências com a goma. 
Bastante trabalho até conseguir uma boa revelação...











A goma é uma técnica bem difícil de fazer quando se está começando. Eu joguei muito papel fora até conseguir um resultado decente. A emulsão é espessa, o que dificulta uma aplicação razoavelmente uniforme no papel. Também a quantidade de pigmento precisa ser bem calculada, ou a imagem pode ficar muito lavada ou muito carregada, perdendo definição. Normalmente a fotografia em goma tende a ser menos definida, e por isso muitas vezes eu faço em conjunto com o cianótipo. É uma forma de conseguir trazer mais detalhe para a imagem final, já que o cianótipo costuma gerar imagens mais nítidas.
Animus. Amanda Branco, 2012. 
Goma bicromatada e cianótipo sobre papel.







Serpente. Amanda Branco, 2014. Goma bicromatada sobre papel.
















Animus. Amanda Branco, 2013. Goma bicromatada sobre papel.




















































Com todas essas variáveis, é impossível fazer duas cópias iguais de fotografia em goma bicromatada a partir do mesmo negativo. Quando comecei, eu fazia numerações nas impressões, seguindo a clássica definição para gravura em que além da assinatura o artista deve marcar o número total da tiragem e o número de série da gravura (convencionada no III Congresso das Artes em Viena, 1960). Depois cheguei à conclusão de que isso não faz sentido quando estamos trabalhando com fotografia artesanal. Cada uma das impressões é única; e eu não pretendo fazer delas uma cópia. Prefiro então marcar em todas a notação P.U. (prova única).

Serpente em Madeira. Amanda Branco, 2015. 
Goma bicromatada sobre madeira.


























Acredito que essa é a minha técnica favorita por que eu posso exibir virtuosismo em uma técnica difícil permite que eu faça um trabalho de cor, e por ser tão aberta a intervenções; e até a diferentes suportes. Já consegui fazer algumas revelações em E.V.A. e também em madeira, que é o suporte escolhido para a minha pesquisa do mestrado. Vejo muito potencial plástico na goma bicromatada, e por isso estou me aprofundando nesse processo.

quinta-feira, 2 de março de 2017

Apresentando: MAHKU

Imagem daqui:
m.facebook.com/movimentosdosartistashunikuin/


























Algum tempo atrás eu tinha a ideia de que os povos indígenas não criam arte da mesma forma que nós entendemos, em uma sociedade urbana. Sabia que eles tem uma produção estética, que pode ser maravilhosa, mas acreditava que seria algo muito inserido no dia a dia, como um objeto de uso cotidiano, ou de uso ritual; e não como um objeto cuja principal finalidade é a apreciação estética.
Mas os povos indígenas são muitos! Existem muitos povos que não conheço, ou sobre quem não tenho informações atuais. (Minha principal referência era o livro Grafismo Indígena, de Lux Vidal -organizadora, publicado em 1992. É um ótimo livro, mas pode estar desatualizado: já tem 25 anos!)
Então, para mostrar que essa idéia estava equivocada, hoje quero falar um pouco sobre o MAHKU - Movimento dos Artistas Huni Kuin, citados no post Por Uma Arte Mais Diversa. Os Huni Kuin são um povo indígena localizados na fronteira do Acre com o Peru. O movimento começou com Ibã Huni Kuin, que foi para a cidade cursar o magistério e, ao concluir o curso, recebeu de seus professores a missão de escrever os conhecimentos de seu povo. Ele foi buscar informações de seu pai, e das pessoas mais velhas. Começou então a registrar na língua escrita o que antes era conhecimento oral. Estava assim resgatando elementos da sua cultura que estavam se perdendo: os cantos de ayahuaska, que escreveu na língua Huni Kuin; os mitos, e a própria língua Huni Kuin. Os jovens estavam se afastando desse conhecimento, e ele foi resgatar saberes ancestrais do seu povo. É um trabalho de inestimável valor, para os Huni Kuin e para a humanidade!
Esse resgate dos cantos virou um livro, Espírito da Floresta, além de material didático e também CD.
Depois, juntamente com seus alunos, Ibã começou a traduzir para o desenho os cantos do Espírito da Floresta. Seu objetivo é transmitir esse conhecimento tanto para suas crianças quanto para os povos não indígenas.
Imagem daqui: http://nixi-pae1.blogspot.com.br 





































Em 2011, com uma pequena ajuda da lei de incentivo à cultura começou a promover encontros com os artistas indígenas da aldeia Mae Bena no alto rio Tarauacá. Produziram um pequeno filme, e posteriormente apresentaram seu trabalho em uma exposição em Rio Branco, juntamente com apresentação musical. Agora o grupo segue com a missão de continuar resgatando e promovendo esses conhecimentos através da arte, em um trabalho contínuo.
Imagem daqui:
m.facebook.com/movimentosdosartistashunikuin/


























Observando esses desenhos, percebo uma grande diferença da produção visual indígena que pesquisei na época da faculdade. Vale lembrar que eram outras outras etnias, mas o que eu via era que quase não se fazia figuração; eram na sua maioria grafismos com alto grau de abstração.
Perguntei sobre isso ao grupo, na página deles no Facebook, e o Amilton me relatou que desde o século XIX eles começaram a ter contato com o branco, e assim tiveram acesso a materiais como papel e lápis, e desde a década de 70 começou um movimento de escolarização pelo Estado. Então desde aquela época eles começaram a fazer o uso das imagens desenhadas, chamadas dami. "Com o MAHKU é a primeira vez que se tem notícia de um movimento na direção de tratar temas tradicionais usando a linguagem do desenho e da pintura e de fazer disso uma expressão artística com uma cara huni kuin, com uma proposta de arte huni kuin que articula o tradicional com o contemporâneo; se o MAHKU não inventa os desenhos dami, ele se apropria deles e faz um uso cultural e artístico inédito" (trecho do relato do Amilton, que eu não poderia explicar melhor!)
Se antes havia a pintura de grafismos na pele, agora também fazem pintura na tela e na parede, misturando os dami e grafismos. Ainda não vi ao vivo essas pinturas na parede. Pelas fotos, parecem impressionantes, algo que envolve o espectador, e o transporta para um outro lugar, repleto de seres da natureza e grafismos hipnóticos.
imagem daqui: 
m.facebook.com/movimentosdosartistashunikuin/


























imagem daqui: 
m.facebook.com/movimentosdosartistashunikuin/


























Em diversos desenhos a representação do mundo é fluida, flutuante, psicodélica. Acredito que em parte pela influência do ayahuasca, bebida hipnótica usada por eles. Mas também demonstra uma visão diferente de mundo, em que a representação do espaço segue regras próprias.
Para conhecer mais, confira o blog Espírito da Floresta, em que eles publicam os próprios trabalhos, e a sua página no Facebook
Também podemos ver alguns desenhos deles na exposição Avenida Paulista, no Masp, que vai até 28/5. Os desenhos que integram a exposição foram criados a partir das primeiras impressões que os artistas do movimento tiveram da cidade de São Paulo, em sua visita em 2016. É um olhar “estrangeiro” sobre a cidade, mostrando uma Avenida Paulista habitada por carros e prédios. É uma boa oportunidade para ver uma amostra do trabalho deles, mas ainda quero conhecer mais!
Dami. (Avenida Paulista). Ibã Huni Kuin e Mana Huni Kuin. 
Acrílica sobre tela, 2017.




terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Apresentando: Rosana Paulino


Assentamento, Rosana Paulino.
 Imagem transferida sobre papel,
grafite e aquarela. 37,5 x 27,5 cm. 2012.
Foto daqui: www.rosanapaulino.com.br



























No último post comecei uma discussão sobre a necessidade de trazer mais diversidade para a arte. Nada mais justo do que começar a fazer a minha parte aqui! O blog tem a proposta de trazer também o trabalho de artistas que me inspiram, então começo hoje apresentando a arte de Rosana Paulino.
Conheci o seu trabalho pesquisando artistas que usam técnicas alternativas de fotografia. Ela sobrepõe técnicas diversas, como desenho, gravura, fotografia e bordado. Usa esses procedimentos para criar uma obra com conteúdo político, questionando a situação dos negros em nossa sociedade, e em especial da mulher negra; e levanta questões relacionadas a violência doméstica, que afeta principalmente (mas não apenas) as negras.
De produção contemporânea, ela se difere dos artistas negros do modernismo, que tinham como tema a religiosidade africana, o ambiente mais rural etc. Rosana Paulino é uma artista negra urbana, e aborda temas mais próximos a ela, com a vivência de alguém que cresceu em São Paulo.




















Série Bastidores, Rosana Paulino. Imagens transferidas sobre tecido,
bastidor e linha de costura. 
30cm diâmetro. 1997.
Fotos daqui: www.rosanapaulino.com.br/






























Ela começou os trabalhos artísticos através do desenho e da gravura, mas logo se sentiu limitada por esses meios. Decidiu então trabalhar também com a fotografia, para lidar com as questões relacionadas ao racismo. Arrisco dizer que por conta da impressão de verdade absoluta transmitida pela fotografia (mesmo que as pessoas saibam que essa "verdade" pode ser manipulada ao extremo!).
Na série Bastidores, artista transfere quimicamente imagens fotográficas, que no original eram fotografias 3x4 de mulheres negras, de sua família. Essas imagens foram manipuladas e bastante ampliadas (o trabalho final tem 30 cm de diâmetro), e depois transferidas para tecidos esticados em bastidores. As imagens ficam um pouco borradas, indefinidas. Como algo que está se apagando, ou como uma aparição, algo não dito, apenas sugerido. Posteriormente foram feitos bordados, criando costuras em seus olhos, bocas, gargantas. Cria assim a imagem de mulheres que não podem ver seu lugar no mundo, que não podem falar sobre o que acontece, que trazem um nó na garganta.
Os materiais aqui são domésticos, de uso quase exclusivo femininos, como os bastidores, a linha de costura. A artista traz esse confronto de ideias, para abordar a contradição da realidade de muitas mulheres, cujo ambiente doméstico é seguro, "bucólico", apenas na aparência. É uma obra chocante, necessária para trazer à tona um tema pesado como esse.

Parede da Memória (detalhe), Rosana Paulino.
Técnica mista sobre tecido. 8 x 8 x 3cm. 1994.
Foto daqui: istoe.com.br/445569_O+ACERVO+DIANTE+DO+ESPELHO


















Já a obra A Parede da Memória,  que está no acervo da Pinacoteca,  surgiu de objetos que fazem parte da história da própria artista. Quando criança, na sala de sua casa havia um patuá, um pequeno objeto de tecido costurado retangular, que ficava no alto, protegendo o ambiente. Em sua casa também havia uma caixa de fotografias que ela gostava muito de olhar. Era de certa forma a história de sua família. Rosana decide recriar o patuá com imagens desta caixa de fotografias. Escolheu 11 imagens e reproduziu em grande quantidade. Aparecem repetidas, algumas coloridas manualmente, outras em preto e branco. Formam assim um jogo que remete ao jogo da memória. Essa instalação chega a 1300 peças, criando uma multidão de negros que simplesmente não pode ser ignorada. São histórias que precisam ser contadas e rememoradas, combatendo o apagamento a que os negros estão submetidos na sociedade brasileira.
Parede da Memória.
foto daqui:
www.contemporaryand.com/magazines/the-art-of-the-black-atlantic-ii



















Para quem quer conhecer mais da visão da artista, vale a pena conferir  seu site oficial!


Atlântico Vermelho, Rosana Paulino.
Foto: Amanda Branco.